domingo, 17 de outubro de 2010

Página Um


Todo início é especial. Único. Quando você senta ao lado de um estranho no ônibus e ele abre um livro na primeira página, você presencia o início.
O primeiro dia de aula na escola nova.
O primeiro encontro dos amantes.
Os primeiros momentos de uma história, de uma viagem.
Que presente! O registro de um momento crucial. Que vontade de assistir tudo o que ele viverá. Que curiosidade de saber o que ele achará do final. O língua coça querendo libertar mil perguntas. Os olhos se arriscam ansiando decifrar cada contração da face. A cabeça inquieta deseja viajar nas mesmas figuras de linguagem.
"Que honra estar ao seu lado neste momento ímpar!"
Por que será que não podemos falar com estranhos?

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

A morte do Sonho


Extra! Extra!
O Sonho morreu!
Foi baleado à queima roupa
e encontrado morto pela Esperança
que chorou lágrimas vermelhas:
"Era um grande Sonho.
Tinha um belo futuro pela frente.
Perdi o amor da minha vida,
o que vai ser de mim agora?"
Extra! Extra!
O Sonho morreu,
as balas se perderam
e um buraco ficou!
Extra! Extra!
Compre o jornal,
é só dois real!

sábado, 9 de outubro de 2010

Da janela do ônibus

Sentada, olho pela janela
e vejo casas, edifícios,
pessoas, desejos, experiências,
objetivos que se movem
Todos passando rápido,
distorcidos,
como se eu estivesse parada
e tudo fugisse,
mas sou eu que fujo
e continuo...
enquanto tudo fica para trás
gravado em lembranças arrependidas
daquilo que meus olhos não puderam viver

segunda-feira, 27 de setembro de 2010


Por todos os lados
você vê placas de plástico
que ordenam
coma, coma, coma!
E você come
devora mais e mais
quilos, litros, metros
de plástico vazio
até que o plástico
come você

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Um na multidão





Esta será uma série de crônicas cujos protagonistas são pessoas, simplesmente pessoas. Especialmente aquelas mais comuns.




Chuva. É barulho de chuva. Será que eu vou conseguir levantar? Começo a sentir os dedos das mãos. Sim, já posso mexê-los. Passo a mão no rosto, esfrego os olhos, a remela tá ressecada. Minhas pernas, onde estão? Ah...começo a sentir vida nelas, a dor nas canelas voltou. Passar o dia em pé, na loucura do centro da cidade, debaixo de sol quente e dizendo: "vamos fazer o seu Happycard hoje, senhor?" não é mole! Pelo menos tem o cara da ótica que fica me olhando. É um estímulo, não é? Digo, ele não é lá essas coisas, mas no tipo de vida que eu levo, qualquer estímulo é importante.
Já sinto todo o corpo, me espreguiço, só falta levantar. Essa chuva que não deixa... pensa no carinha da ótica, pensa no carinha da ótica. O despertador! acabaram-se os cinco minutos de enrolação. Levanto, vou ao banheiro, tomo banho (congelo!), me olho no espelho. Mais um longo dia... Visto minha calça jeans e percebo que algumas pedrinhas caíram. Droga, era a calça mais bonita! Dá vontade de nem ir trabalhar depois dessa. Pensa no carinha da ótica e na conta de luz... Visto a camisa da empresa, azul celeste, agora desbotada. É a mesma para todas as meninas, claro! Temos que estar iguais. Passo a maquiagem que todas são obrigadas a usar. Eu gosto de maquiagem, mas a gente é obrigada! A sombra azul tá acabando, passo o que fica nas laterais e na tampa para economizar. Batom melancia, deixa a cara mais viva. Será que ele acha bonito? Perfume, só três gotinhas. Penteio o cabelo e prendo com a piranha azul que combina com a farda.
Agora tenho que comer algo porque não jantei. Minha barriga urra! Geladeira, meio copo de leite e o despertador toca novamente, é hora de sair. Pego a sombrinha e vou à parada de ônibus. A parada fica em frente uma mercearia, compro um biscoito. Será que ele vai falar comigo hoje? Será que vai acontecer alguma coisa hoje?

Continua...